Laboratório Audiovisual

Luciana Alvarenga | 07/01/2022

Ecologia, História e Saúde: o papel da produção audiovisual na educação ambiental

As marcas de um incêndio na Reserva Biológica de Sooretama (ES)

A crise ecológica não é uma crise isolada e está diretamente relacionada a outras crises, sobretudo a da saúde humana, como demonstra bem a atual pandemia do Covid-19. Além de estabelecer restrições ao movimento de pessoas e de gerar uma série de consequências sociais, econômicas e de saúde no Brasil e no mundo, a pandemia revelou de maneira pungente a importância do conhecimento científico sobre os ecossistemas e a biodiversidade, destacando a relevância da conservação dos ambientes naturais para o futuro da humanidade.  Três quartos dos patógenos emergentes que infectam os seres humanos surgiram de animais e a maioria deles vive em habitats que sofreram processos de degradação ambiental. Estudos demonstram que a maior probabilidade de surtos pandêmicos e endêmicos está ligada ao desmatamento e ao uso inadequado de recursos naturais (OLIVERO et al.,2017).  Várias pesquisas têm alertado sobre o papel das alterações ambientais nas condições de saúde humana (JORGE, et al., 2010; SANGENIS, 2016; ALHO, 2012; BARCELLOS, et al., 2009).

Área desmatada para o plantio de soja no Cerrado. Imagem: Luciana Alvarenga

 

A existência de ambientes naturais saudáveis é condição fundamental para a manutenção de serviços ecossistêmicos essenciais para a qualidade de vida e a saúde humana. Num país com a maior biodiversidade do planeta, a produção científica sobre esse universo deve ocupar um lugar de destaque no meio acadêmico e na divulgação científica. De acordo com os organizadores do Primeiro Diagnóstico Brasileiro de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos, a conservação e o uso sustentável da biodiversidade deveria ser um dos elementos centrais, transversais e estratégicos para o desenvolvimento socioeconômico (JOLY et al., 2019).

Mata de Tabuleiro na Bahia. Imagem: Carlos Sanches

 

Estudos sobre Ecologia, História das Ciências, História Ambiental, Saúde e Meio Ambiente, entre outros temas correlatos,  são fundamentais não só para o desenvolvimento da ciência e a promoção do conhecimento científico, mas para nortear ações que garantam a manutenção do equilíbrio ecológico, da regulação climática, dos ciclos biogeoquímico e da água, da disponibilização de polinizadores para a agricultura, entre outros serviços essenciais  (GAUDERETO,2019; ANNERSTEDT e DEPLEDGE, 2015; RICKLEFS, 2010 apud ALVARENGA et al., 2020).

Macacarecuias no Parque Nacional do Jaú (AM). Imagem: Carlos Sanches

 

Assim, todas as ações que fortaleçam a produção e a difusão desse conhecimento científico e que gerem a possibilidade de novas práticas de conhecimento são de extrema importância. O papel da produção audiovisual no contexto da educação ambiental e no acesso à informação por meios digitais e virtuais se tornou essencial (ALVARENGA et al., 2020). O recurso audiovisual se apresenta como um excelente instrumento, tanto para o registro de dados pesquisáveis, quanto para a organização, a interpretação e a divulgação de conhecimentos científicos. Através da construção de narrativas diversas, dinâmicas e atraentes, o audiovisual possibilita diferentes usos por meio de processos de mediação variados (ARROIO e GIORDAN, 2006). Oliveira e Trivelato (2006) apontam que através de recursos audiovisuais é possível construir conhecimentos de maneira diferenciada. Além de ser um poderoso instrumento de sensibilização, permitindo a utilização de inúmeros recursos narrativos e estéticos, os diversos tipos de equipamentos de produção audiovisual existentes hoje possibilitam novas formas de visualização e de estudo sobre diferentes espécies e ambientes.

Cumulus nimbus na Amazônia. Imagem: Carlos Sanches

Dentro dessa estratégia, o audiovisual se revela uma ferramenta versátil, dinâmica e possibilita a construção de uma infinidade de produtos com diferentes formatos, técnicas e durações, podendo dialogar com públicos diversos e com objetivos variados (SANCHES e ALVARENGA, 2019).  Através de diferentes veículos, o audiovisual atinge a quase totalidade da população brasileira. A televisão está presente em 96,7% dos domicílios (IBGE/PNAD, 2017). A visualização de vídeos através da internet cresce a uma taxa de 26% ao ano (ANCINE, 2018). Sem contar que a sua utilização em processos educativos e participativos, em museus e outros espaços expositivos, tem se tornado cada vez mais frequente. Assim, seria previsível que o audiovisual surgisse como uma das ferramentas mais utilizadas para a educação no país. No entanto, não é isso que ocorre. A realização de produções audiovisuais com esse objetivo ainda é bem limitada. Em relação a produção de conteúdos sobre a biodiversidade, a complexidade e a variedade do ambiente natural brasileiro, bem como as características singulares de tantas e diferentes espécies, oferecem inúmeros desafios à produção audiovisual, gerando a necessidade de equipamentos e de métodos de captação de imagens específicos.

Campo limpo no Parque Nacional das Emas. Imagem: Carlos Sanches

Por isso, um dos principais motivos para a não utilização dessa ferramenta é a falta de recursos não só para a realização de produções diversas, mas principalmente para o estabelecimento de estruturas de produção que permitam o desenvolvimento de metodologias, de formatos, de técnicas, e, de processos produtivos contínuos e de qualidade, para diferentes usos através da web, de TVs públicas e universitárias, de rádios públicas, em salas de aula e diversos outros espaços de comunicação, de educação e de divulgação do conhecimento científico e acadêmico.

 

As cooperações técnicas estabelecidas entre a Casa de Oswaldo Cruz, a EBC/TV Brasil e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio, possibilitaram a produção de uma série de TV Parques do Brasil, exibida desde 2018 através da Rede Nacional de Comunicação Pública, com ótimos resultados de audiência. Voltada à divulgação de conhecimentos científicos sobre a biodiversidade, os ecossistemas e as unidades de conservação brasileiras.

Parque Nacional do Pantanal Matogrossense. Imagem: Luciana Alvarenga

Com o objetivo de promover a popularização do conhecimento científico sobre a biodiversidade, o patrimônio natural e cultural, e, a história ambiental brasileira, enfatizando a relação do meio ambiente, a saúde e a qualidade de vida, implementamos com recursos da FAPERJ o Laboratório de Criação e Produção Audiovisual sobre Biodiversidade, Saúde, Mudança do Clima e Degradação da Terra e estamos realizando uma série de ações tendo como objetivo central o estabelecimento de um processo contínuo de produção de conteúdos audiovisuais inéditos, tornando esse conteúdo disponível para diversos segmentos da população por meio da web e da TV aberta, através da Rede Nacional de Comunicação Pública.

Referências Bibliográficas

ANCINE. Anuário Estatístico do Cinema Brasileiro. Rio de Janeiro: ANCINE, 2018.

ARROIO, Agnaldo; GIORDAN, Marcelo. O vídeo educativo: aspectos da organização do ensino. Química Nova na Escola . nº24, p. 7-10, nov 2006. ALHO, C. J. R. Importância da biodiversidade para a saúde humana: uma perspectiva ecológica. Estud. av., São Paulo, v. 26, p. 151-166, 2012.

ALVARENGA, L.; SANCHES, C. E. T.; MUCHAGATA, M. Parques do Brasil: a conservação da biodiversidade como promoção da saúde e qualidade de vida. Rev Brasileira de Educação Ambiental, São Paulo, v. 5 n. 5, p 230-249, 2020.

ANNERSTEDT, M. V. B.; DEPLEDGE, M.H. Healthy people with nature in mind. BMC Public Health, v. 15, p. 1-7, 2015.

ARROIO; GIORDAN, 2006 BARCELLOS, C. et al. Mudanças climáticas e ambientais e as doenças infecciosas: cenários e incertezas para o Brasil. Epidemiologia e Serviços de Saúde, Brasília , v. 18, n. 3, p. 285-304, set. 2009. COC/FIOCRUZ/EBC. Convênio de Cooperação Técnica nº. 101/2017 com a Empresa Brasil de Comunicações. Rio de Janeiro, 2017.

COC/FIOCRUZ/ICMBio. Acordo de Cooperação Técnica nº. 088/2017 com o Instituto Chico Mendes de Conservação a Biodiversidade. Rio de Janeiro, 2017. IBGE/PNAD. Pesquisa Nacional por amostra de Domicílio. Rio de Janeiro: IBGE/PNAD, 2017. JOLY, Carlos. A. et al. 1o Diagnóstico Brasileiro de Biodiversidade & Serviços Ecossistêmicos. Ed. Globo, p. 351, 2019.

JORGE, R. S. P; et al. Ocorrência de patógenos em carnívoros selvagens brasileiros e suas implicações na saúde pública. Rev. Oecologia Australis, v.14, n 3, p 686-710, 2010. GAUDERETO, G. L.; et al. Avaliação de serviços ecossistêmicos na gestão de áreas verdes urbanas: promovendo cidades saudáveis e sustentáveis. Ambi-ent. soc., São Paulo , v. 21, e01203, 2018.
OLIVERO, J., Fa, J.E., REAL, R. et al. Recent loss of closed forests is associ-ated with Ebola virus disease outbreaks. Sci Rep, 7, 14291, 2017.

TRIVELATO, Silva L.F.; OLIVEIRA, Odisseia Boaventura. Práticas docente: o que pensam os professore de ciências biológicas em formação. XIII ENDIPE. Rio de Janeiro, 2006.

SANCHES,C.; ALVARENGA, L. Parques do Brasil: a concepção de uma série de documentários de história natural e a promoção da conservação da biodiversidade e das unidades de conservação brasileiras. Revista Museologia & Interdisciplinaridade, Brasília, v. 8, p. 191-209, 2019. SANGENIS, L. H. C.; et al . Transmissão da doença de Chagas por consumo de carne de caça: revisão sistemática. Rev. bras. epidemiol., São Paulo , v. 19, n. 4, p. 803-811, 2016 . RICKLEFS, R.E. A economia da Natureza. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010.

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